Os documentos eletrônicos e dispensa da assinatura por duas testemunhas
No dia 14 de julho de 2023 entrou em vigor a Lei nº 14.620, que trouxe importante alteração no Código de Processo Civil no que tange ao quesito de executividade dos títulos extrajudiciais, constituídos ou atestados por meio eletrônico.
Inicialmente, só era considerado título executivo extrajudicial o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas (art. 784, inciso III do CPC).
Contudo, a Lei nº 14.620 inseriu o parágrafo quarto no artigo 784 do Código de Processo Civil passando a dispensar a assinatura de duas testemunhas nos documentos eletrônicos quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura:
Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: […]
- 4º Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura.
A recente alteração legislativa reflete o entendimento que há muito vem sendo firmado pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça – quando no julgamento do REsp nº 1.495.920, ainda no ano de 2018, reconheceu a executividade de um título extrajudicial assinado de forma eletrônica, sem a assinatura de duas testemunhas.
Pela redação do §4º do artigo 784 do Código de Processo Civil, para que ocorra a dispensa da assinatura das testemunhas, é necessário que o título executivo: (i) tenha sido assinado de forma digital, forma esta, devidamente prevista em lei e (ii) que a integridade da assinatura seja conferida por provedor.
De acordo com a Lei nº 14.063 de 23 de setembro de 2020, que regulamenta as assinaturas eletrônicas, as referidas assinaturas podem ser classificadas de três formas, sendo: assinatura eletrônica simples, assinatura eletrônica avançada e assinatura eletrônica qualificada.
A assinatura eletrônica simples é aquela que permite identificar o seu signatário e anexa ou associa dados a outros dados em formato eletrônico do signatário.
Enquanto a assinatura eletrônica avançada utiliza certificados não emitidos pela ICP-Brasil ou outro meio de comprovação da autoria e da integridade de documentos em forma eletrônica, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.
Tal modelo de assinatura possui as seguintes características: a) está associada ao signatário de maneira unívoca; b) utiliza dados para a criação de assinatura eletrônica cujo signatário pode, com elevado nível de confiança, operar sob o seu controle exclusivo; c) está relacionada aos dados a ela associados de tal modo que qualquer modificação posterior é detectável.
Já a assinatura eletrônica qualificada é aquela que utiliza certificado digital, nos termos do § 1º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001. A referida Medida Provisória instituiu a infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica.
Assim, a primeira parte do §4º do artigo 784 do Código de Processo Civil, que prevê “nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei […]”, reconhece como válida qualquer modalidade de assinatura eletrônica utilizada, seja a assinatura eletrônica simples, avançada ou qualificada.
Contudo, em relação a segunda parte do dispositivo “[…] dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura”, a Lei é omissa em relação a quais modalidades de assinatura tem o condão de dispensar a assinatura de duas testemunhas.
Analisando o dispositivo supracitado e as decisões proferidas pelo STJ, orientamos que a dispensa das assinaturas de testemunhas, ocorra somente quando da utilização de assinatura eletrônica qualificada e desde que a assinatura seja atestada por um provedor de assinatura (Docusign, Clicksign, TOTVS assinatura eletrônica, entre outros).
Portanto, se a empresa utiliza algum provedor de assinatura, orientamos que entrem em contato com o referido provedor, para certificar se a modalidade de assinatura utilizada se enquadra no conceito de assinatura eletrônica qualificada, que é aquela que utiliza certificado digital, nos termos do § 1º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001.
Posteriormente, se o legislador ou a jurisprudência, aclarar que tal dispensa se aplica a qualquer tipo de assinatura, iremos informar para estenderem tal dispensa às demais modalidades de assinatura eletrônica.
Caso optem por dispensar as assinaturas de testemunhas nos casos elencados acima, é importante que busquem auxílio junto ao jurídico, para incluir nos documentos uma cláusula em relação a dispensa das testemunhas, em consonância com o artigo 784, §4º do Código de Processo Civil.
Por fim, vale reforçar que a referida dispensa se aplica tão somente aos documentos assinados de forma eletrônica, de modo que a regra inicial permanece inalterada para os documentos assinados de forma física.
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