A flexibilização da impenhorabilidade das verbas alimentares

O direito brasileiro classifica como verbas alimentares aquelas destinadas ao sustento do indivíduo e de sua família, atribuindo-lhes caráter essencial e assegurando por meio da impenhorabilidade que não venham a ser tomadas do devedor em eventual execução.
Significa dizer que, como regra geral, e seguindo o que dispõe o artigo 833, inciso IV, do Código de Processo Civil, “os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal” não podem ser penhorados pelo credor em eventual execução para a satisfação do crédito.
Contudo, o próprio §2º deste artigo já trouxe consigo, a partir da entrada em vigor do Código de Processo Civil em 2015, exceções a esta regra, permitindo a penhora destas verbas quando se tratar de execução de pensão alimentícia ou quando referida verba for superior a 50 (cinquenta) salários mínimos.
Por muito se criticou este patamar estabelecido pelo legislador, visto que, num país como o Brasil, grande parte da população está longe de alcançar essa quantia, tornando quase impossível que um credor consiga satisfazer seu crédito se o devedor não possui algum bem em seu nome, e ainda deverá contar com a sorte de que este bem não venha a ser também declarado impenhorável.
Obviamente que o objetivo daqueles que sempre criticaram o patamar estabelecido pela lei não era de derrubar completamente a impenhorabilidade, deixando o devedor a esmo, desamparado, sem ter de onde tirar o seu sustento. Sempre se buscou uma solução adequada, defendendo-se que fosse analisado caso a caso.
Justamente essa perspectiva que foi levada ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de que fosse discutida a questão com mais aprofundamento, tendo a Corte, por fim, ainda em maio deste ano, através do julgamento do EREsp nº 1.874.222, flexibilizado a impenhorabilidade das verbas alimentares quando demonstrado que o devedor ganha o suficiente para honrar suas dívidas e manter o seu padrão de vida.
Noutras palavras, tornou-se possível a penhora do salário e demais verbas alimentares para o pagamento de qualquer tipo de dívida, não mais se limitando às execuções de pensão alimentícia, além de também não se exigir mais que o valor recebido pelo devedor seja superior a 50 (cinquenta) salários mínimos, bastando que ele ganhe o suficiente para não ter seu sustento prejudicado com a penhora de parte dos seus ganhos.
Tal alteração finalmente dá um folego para os credores do Brasil, criando uma nova possibilidade para o recebimento de seus créditos quando não encontrada nenhuma outra saída, evitando assim o prejuízo antes tido como certo.
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